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A sabedoria e o poder de Deus


Terminando Paulo sua magistral exposição do evangelho nos primeiros onze capítulos de Romanos, o modo pelo qual Deus apresentou a Cristo como o sacrifício propiciatório, justifica os pecadores através da fé em Cristo, transforma-os mediante a obra interior do Espírito e está criando a sua nova comunidade à qual os gentios são admitidos nas mesmas condições que os judeus, ele exclama em extasiada doxologia: “Ó profundidade da riqueza, tanto da sabedoria, como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos e quão inescrutáveis os seus caminhos!. . . Porque dele e por meio dele e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém” (11:33-36). Antes o apóstolo vê a morte expiatória de Cristo como uma demonstração da justiça e do amor de Deus; agora é vencido por um sentimento da sabedoria de Deus - a sabedoria de projetar um plano de salvação tão custoso que ao mesmo tempo preenche as nossas necessidades e satisfaz ao seu próprio caráter.

A cruz como a sabedoria e poder de Deus é o tema principal de 1 Coríntios 1:17-2:5, especialmente em contraste com a sabedoria e o poder do mundo. É a menção que Paulo faz do “evangelho” que dá partida à sua meditação, pois ele imediatamente sabe que precisa tomar uma decisão quanto ao seu conteúdo. A escolha é entre “palavras de sabedoria humana” e “a cruz de Cristo”. Se ele optasse pela sabedoria humana, a cruz seria “esvaziada”, desnudada, deveras destruída (1:17). De modo que escolhe a “mensagem da cruz”, a qual ele sabe ser loucura para os que estão perecendo, mas ao mesmo tempo é o poder de Deus aos que estão sendo salvos (1:18). Sabedoria impotente ou poder louco: foi (e ainda é) uma escolha decisiva. A combinação que não é opção é a sabedoria do mundo mais o poder de Deus.

O motivo pelo qual Paulo opta pelo poder contra a sabedoria, o poder de Deus contra a sabedoria do mundo, é que Deus no Antigo Testamento já declarou a sua intenção de destruir a sabedoria do sábio e frustrar a inteligência dos entendidos (1:19). De modo que, se Deus já se pôs contra eles, onde se encontram os sábios, os entendidos e os filósofos deste século? Deus já não decidiu contra eles tornando a sua sabedoria em loucura (1:20)? Eis como ele o fez. Em sua sabedoria Deus primeiro decretou que o mundo, através de sua própria sabedoria, não o conheceria, e então se agradou em salvar os que crêem por meio da loucura do evangelho revelado e pregado (1:21). De forma que se torna claro novamente que o poder (o poder salvador) não está na sabedoria do mundo mas na loucura de Deus, a saber, o evangelho do Cristo crucificado.

Pode-se ver esse princípio em operação na evangelização dos judeus e gregos, pois ambos os grupos determinam condições sobre as quais o evangelho lhes seria aceitável. “Tanto os judeus pedem sinais, como os gregos buscam sabedoria” (1:22). Em outras palavras, insistem em que a mensagem deve autenticar-se para eles respectivamente mediante o poder e a sabedoria. Em contraste total com suas exigências, contudo, “pregamos a Cristo crucificado” (1:23), que nem mesmo chega perto de conformar-se com os critérios deles. Pelo contrário, os judeus acham a cruz um “escândalo” e os gentios “loucura”, pois ela os ofende em vez de impressioná-los, ao passo que para os que são chamados por Deus, quer judeus, quer gregos, é o oposto exato. Embora crucificado em fraqueza, Cristo é o poder de Deus, e embora aparentemente tolo, é a sabedoria de Deus (1:24). Pois o que os homens vêem como loucura de Deus é mais sábio do que a sabedoria deles, e o que vêem como a fraqueza de Deus é mais forte do que a força deles (1:25). Em resumo, os valores divinos e os humanos discordam completamente um do outro. E a cruz, que como meio de salvação parece o auge da impotência e estultícia, na realidade é a maior manifestação da sabedoria e do poder de Deus.

Paulo coroa o seu argumento com duas ilustrações, a primeira tirada da experiência da chamada e conversão dos coríntios (1:26-31), e a segunda de sua própria experiência de evangelização. Quanto a eles, segundo os padrões humanos, não muitos eram sábios ou poderosos. De fato, Deus deliberadamente escolheu o que o mundo considera como pessoas tolas e fracas, a fim de envergonhar as sábias e fortes; escolheu até as humildes, as desprezadas e as que não são, para anular as que são. O seu objetivo nisso era excluir a vanglória humana. A vangloria estava totalmente fora de lugar, porque fora Deus quem os tinha unido a Cristo, e Cristo que se havia tornado a sabedoria deles (revelando-lhes Deus) e o poder deles (trazendo-lhes justificação, santidade e a promessa da redenção final). Portanto, como dizem as Escrituras, se alguém se gloriar, glorie-se hão em si mesmo, nem nos outros, mas no Senhor somente.

Quanto a Paulo, o evangelista, ao chegar a Corinto, não fora com mensagem de sabedoria humana. Nem tinha ele ido em sua própria força. Pelo contrário, havia levado a mensagem louca e revelada da cruz, confiando somente no poder do Espírito Santo para confirmar a palavra. Todo o seu propósito em ir a eles em tal loucura e fraqueza era que a sua fé descansasse firmemente no poder de Deus, não na sabedoria dos homens.

O que temos ouvido através de toda essa passagem são variações do tema da sabedoria e do poder de Deus, sua sabedoria através da loucura humana e o seu poder através da fraqueza humana. O evangelho da cruz jamais será uma mensagem popular porque humilha o orgulho de nosso intelecto e caráter. Contudo, Cristo crucificado é tanto a sabedoria de Deus (1:24) como a nossa (1:30). Pois a cruz é o modo pelo qual Deus satisfaz ao seu amor e justiça na salvação dos pecadores. Portanto, ela também manifesta o seu poder, “o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê” (Romanos 1:16).

De sorte que quando olhamos para a cruz, vemos a justiça, o amor, a sabedoria e o poder de Deus. Não é fácil determinar qual desses aspectos é mais brilhantemente revelado, se a justiça de Deus ao julgar o pecado, se o amor de Deus ao levar o castigo em nosso lugar, se a sabedoria de Deus em combinar com perfeição as duas coisas, ou se o poder de Deus em salvar aqueles que crêem. Pois a cruz é, de igual forma, um ato, e portanto uma demonstração da justiça, do amor e da sabedoria de Deus. A cruz nos assegura que esse Deus é a realidade dentro, por trás e além do Universo.

(John Stott, A Cruz de Cristo, Editora Vida)

Retirado do Blog http://blog.monergismo.com/?p=8

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